04 abril 2005

Sonhos (1)

Somos sempre campeões nos sonhos. Costumava voar. Voar é facílimo desde que se consiga descolar. Quase todas as semanas voava. Preparava o impulso e o peito ficava levíssimo, os braços alinhados com o corpo, as pernas juntas como uma cauda e o corpo planando na direcção dos ventos. Os ventos quase sempre sopravam para o lado do Colégio das Meninas. Voava até ao Colégio das Meninas, até às camaratas do último andar, dormia com a Maria de Deus, a mais bonita, na cama apertadinha dela, e saía de manhã, antes das outras internas acordarem e da Irmã Imaculada tocar a despertar. Na Invasão dos Bárbaros, um homem conta que desde miúdo sonha com uma mulher que se banha nas águas de uma praia. A mulher é sempre a mesma, só as roupas mudam com o passar dos anos. Ele sabe que morrerá quando essa mulher desaparecer do seu sonho. Eu estive sem voar um mês seguido e pensei que tinha morrido. Até que uma noite voltei a ser capaz. Voei por cima do olival, da mata cerrada, da torre do seminário. A Maria de Deus já não está no Colégio das Meninas, não vale a pena subir à camarata.

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