07 outubro 2004

Correio

Entrei no restaurante dos Sábados. De todos os Sábados em que não houve doença ou ausência ou mais contrariedades menores. Levava a criança pela mão, embora não exactamente a mesma criança. Ou sim, exactamente a mesma criança, agora roubada de alguma coisa do que é ser criança. Foi sentada à mesa, a criança ao meu lado distraída com a manteiga, que aconteceu o pensamento, a voz do narrador que reconhece todos os acontecimentos antes e depois e avançava: é a tua vida, lembras-te? Dois dias mais e saía do serviço quando voltou a acontecer. Comprava eu o bolo de Ançã à Dona Alice quando me surpreendeu a minha vida a voltar. Passou depois a acontecer muito, mas não demais, para eu recolher as marcas todas do que poderia ter esquecido, pequenas. Se escrevesse a minha vida teria de contar do lenço preto da Dona Alice e do sabor das queijadas de Tentúgal, do som da campainha da casa, do cheiro do cabrito na travessa, do perfume da minha mãe, da pele lisa da Inês, das canções da rádio no carro, das primeiras castanhas no Outono, duma manta azul no braço do sofá, agora eu sei.

//sent by Sofia

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