09 março 2004

Maria do Rosário Pedreira

Em 2001 foi um dos meus livros preferidos. Se teve algum êxito de vendas julgo ter contribuido modestamente. Acho que todos os meus amigos o leram. Na noite em que André Bonirre encheu a casa amarela e me sentei num canto a ler, O Canto do Vento nos Ciprestes era um dos livros da bagagem. Li em surdina
a noite é um poema
que conheço de cor e vou cantar-to até adormecer
.
e
A voz sem palavras, um livro lido
às escuras, um bilhete cifrado deixado nnum hotel,
um velho calendário cheio de desencontros. Não,

não há memória deste amor.


e outras das mais pequenas histórias do mundo.

Lembro-me do dia em que encontrei o livro e de como o li no café da Foz, ao almoço cheio de sol e vento quando nalgumas mesas confraternizavam os que, dois anos depois, iriam fundar os blogs do norte.
Maria do Rosário Pedreira compunha um personagem assustador: uma mulher que permanece fiel ao homem que a abandonou e prepara a casa, a mesa, os lençóis da cama, para um regresso que percebemos não virá a acontecer. Os poemas eram perfeitos, alinhados num gume de extremo risco mas mantendo o mesmo fôlego e a mesma coerência. Poemas para serem ditos como a Duras aconselha que seja o texto de India Song. Com o tempo afastei-me da poesia de Maria do Rosário como de uma doença, uma fraqueza, um lado mau de mim. Há tempos estive à beira de um sacrilégio: aconselhar a sua leitura como elemento curricular obrigatório da Educação Sentimental para o uso dos rapazes que porventura lêm os blogs. Eles devem aprender a não abraçar as mulheres que vão deixar. Ou serão para sempre perseguidos pelas que não sabem esquecer. Felizmente parei, à beira da injustiça.
Hoje, como já noticiou a Sandra, Maria do Rosário Pedreira editou Nenhum Nome Depois. Os nomes inúteis- os nomes dos que podíamos ter amado; Os nomes interditos- os nomes que são ditos no sono, em vez do nosso; Os nomes de família- belíssimos poemas aos pais; Nenhum nome depois- porque esta mulher só encontrará corpos a quem dará o nome que esconde, o nome do amado, o único nome.
A evitar absolutamente, esta poesia que pode envenenar 2004.

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